Em vigor há 11 anos, Patrimônio Imaterial segue sem tombamentos em Limeira
Burocracia na tramitação dos registros impede que a cidade registre oficialmente sua lista de bens culturais

De acordo com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), os chamados bens culturais de natureza imaterial são práticas e domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer, além de celebrações, formas de expressão artísticas e lugares como mercados, feiras e santuários que abrigam práticas culturais coletivas.
A Constituição Federal de 1988 reconhece a existência de bens culturais de natureza material e imaterial e sua inclusão no patrimônio a ser preservado pelo Estado, em parceria com a sociedade. Já a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) define como patrimônio imaterial "as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos os indivíduos, reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural."
Instituído em 2014, por meio de uma lei de autoria dos então vereadores Ronei Costa Martins e José Farid Zaine, o Programa Permanente de Proteção e Conservação do Patrimônio Imaterial do Município de Limeira segue sem qualquer inclusão em sua lista de tombamentos.
A intenção da norma era conhecer, identificar e registrar as expressões culturais da cidade, além de apoiar e fomentar os bens registrados, criando condições e incentivos para a promoção de uma rede de parceiros que pudessem contribuir para a valorização e difusão do patrimônio imaterial limeirense, catalogado em quatro categorias:
- Livro de Registro dos Saberes, no qual serão inscritos conhecimentos e modos de fazer, enraizados no cotidiano das comunidades;
- Livro de Registro das Celebrações, no qual serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, o entretenimento e outras práticas da vida social da cidade;
- Livro de Registro das Formas de Expressão, no qual serão inscritas manifestações literárias, musicais, artísticas, cênicas e lúdicas;
- Livro de Registro de Sítios e Espaços, no qual serão concentrados e reproduzidas as práticas culturais coletivas.
No ano da sanção da lei, a vereadora Erika Tank (PL) tentou, por meio de projetos de lei, a inclusão de três bens imateriais na lista: as feiras livres do município de Limeira, o derby limeirense GaLeão/LeGal (Inter e Independente de Limeira) e a lenda de Frei João das Mercês na fundação da cidade. Em 2016, o vereador Sidney Pascotto queria incluir a Marcha para Jesus como bem imaterial da cidade. Todas as propostas foram declaradas inconstitucionais por vício de iniciativa.
Na mesma época, a parlamentar chegou a apresentar um projeto que criava o Museu Virtual do Patrimônio Imaterial, criando um site específico para esse fim, com domínio próprio e acessível para consulta. A proposta foi arquivada após a autora não colocá-lo para votação em plenário. O mesmo se deu com três requerimentos solicitando a inclusão dos bens acima citados, quando a prefeitura alegou que enviaria a solicação ao órgão competente, em 2017, e que não resultou no devido registro (leia mais abaixo).
Atualmente
Segundo a legislação, os pedidos para registro são dirigidos ao Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arquitetônico e Cultural de Limeira (Condephali) para deliberação e são partes legítimas para provocar a instauração do processo: a administração municipal, por seus órgãos e colegiados; as associações civis regularmente constituídas; a população por subscrição mínima de mil signatários; e a Câmara Municipal, por suas comissões e vereadores.
Em resposta a um questionamento via Lei de Acesso à Informação (LAI), o atual secretário interino da Cultura, Silvio Britto, informou que não há decreto regulamentador por ser uma lei auto-aplicável, que já traz elementos suficientes para sua aplicabilidade na prática e até define órgão específico para a deliberação sobre os registros.
Em consulta ao Condephali, Britto aponta não houve registros tombados e que atualmente constam em aberto apenas três pedidos de inclusão no patrimônio imaterial, todos com data de 2024 (dez anos após a publicação da lei):
Coxinha
Quitute popular, considerada como um salgado tipicamente limeirense, tendo sido criado na Fazenda Morro Azul, com sua possível origem na cidade de Limeira e que, devido a sua popularidade, foi criada uma festa em sua homenagem. (Processo 22.017/24)
Banda Arthur Giambelli
Considerada uma banda de extrema relevância para o município de Limeira, sendo uma das mais antigas ainda em atividade na cidade. (Processo 22.019/24)
Banda Henrique Marques
Considerada uma das bandas mais antigas formada no município e que ainda está em plena atividade. Foi a primeira banda de música de Limeira, sendo uma das primeiras do Estado de São Paulo. (Processo 22.023/24)
No Brasil
O Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (PNPI), instituído em 2000, viabiliza projetos de identificação, reconhecimento, salvaguarda e promoção da dimensão imaterial do Patrimônio Cultural Brasileiro, com respeito e proteção dos direitos difusos ou coletivos relativos à preservação e ao uso desse bem.
É um programa de apoio e fomento que busca estabelecer parcerias com instituições dos governos federal, estaduais e municipais, universidades, organizações não governamentais, agências de desenvolvimento e organizações privadas ligadas à cultura e à pesquisa.
No âmbito nacional, o Iphan mantém um site com o acervo de todos os registros efetuados nos últimos 25 anos. Ao todo, 58 bens constam nos quatro livros de registros. São exemplos de bens imateriais brasileiros:
Modo de fazer o Queijo Minas artesanal
Ofício das Baianas de Acarajé
Ofício dos Mestres de Capoeira
Ofício, saberes e práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil
Círio de Nossa Senhora de Nazaré
Complexo Cultural do Bumba-meu-Boi do Maranhão
Festa do Divino Espírito Santo da Cidade de Paraty/RJ
Festa do Senhor Bom Jesus do Bonfim
Frevo
Roda de Capoeira
Literatura de Cordel
Repente
Choro
Samba de roda do Recôncavo Baiano
Feira de Caruaru
Feira de Campina Grande