Agendada tentativa de conciliação sobre racismo cometido em supermercado em 2021
Há quatro anos, ato praticado por seguranças contra um metalúrgico de 56 anos teve repercussão nacional e gerou ações por dano moral coletivo, com valores que ultrapassam R$ 260 milhões

Foi marcada a audiência de tentativa de conciliação sobre duas ações civis públicas movidas por entidades do Movimento Negro por dano moral coletivo contra o Assai Atacadista pelo caso envolvendo um metalúrgico negro de 56 anos que foi obrigado a se despir para comprovar que não havia furtado mercadorias na unidade de Limeira, em agosto de 2021.
No dia 17 de setembro, às 15h30, as partes envolvidas se reunirão por videoconferência realizada pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania de Limeira. O pedido feito em maio de 2024 partiu do coletivo Cidadania, Antirracismo e Direitos Humanos - representando entidades como Soeuafrobrasileira, Coletivo de Advogados pela Democracia (COADE) - e também da Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes), quando ambas autoras das ações solicitaram na 5ª Vara Cível de Limeira o agendamento da audiência de conciliação com a empresa Sendas Distribuidora, razão social do mercado.
Relembre o caso
No dia 6 de agosto de 2021, o metalúrgico Luiz Carlos da Silva foi obrigado a tirar parte da roupa após ser abordado por seguranças dentro do Assaí localizado em Limeira, para provar que não tinha furtado nada do interior da loja. O fato foi registrado em um vídeo que circulou nas redes sociais e noticiários da época, causando forte comoção com repercussão nacional.
Na ação coletiva, registra-se o fato de que um dos funcionários, ao ser questionado por uma outra cliente sobre os motivos da abordagem, respondeu “abordagem normal” e que diante da gravidade da situação, o homem teria tirado o restante a roupa na tentativa de provar que não tinha pego nada no estabelecimento.
“A vítima contou que, ao fazer pesquisa de preços na loja do Réu, considerando os valores muito altos, resolveu não comprar e ir embora. Na saída do estabelecimento foi barrado pelos seguranças do local que o acusaram de tentar furtar do estabelecimento. Os seguranças chamaram reforço e o levaram para o fundo da loja, onde não poderia ser filmado. Relembrando os fatos a vítima explicou que naquele momento aumentou seu desespero, porque se sentia “um cachorrinho acuado”. Tomada pelo desespero do constrangimento, para provar sua inocência diante da exposição pública, despiu-se e disse: “eu não preciso roubar nada de ninguém, eu trabalho e faço parte de uma comunidade que quando alguém precisa, um ajuda o outro”.
Em nota emitida na época do fato, o Assaí afirmou ter afastado o segurança envolvido na ação e afirmou ter aberto sindicância para apurar o que aconteceu e que entrou em contato com a família do cliente para prestar assistência.
“A empresa se desculpa pela abordagem indevida que causou o constrangimento ao sr. Luiz Carlos na última sexta-feira na unidade de Limeira. A companhia recebeu com indignação as imagens dos vídeos e se solidariza totalmente com o cliente. Como decisão imediata, ainda no final de semana, foi aberto um processo interno de apuração, realizado o afastamento do empregado responsável pela abordagem e, hoje, concluído o seu desligamento. A companhia também entrou em contato com a família do cliente, tão logo soube do ocorrido, se desculpando e se colocando à disposição para qualquer necessidade que ele tenha. Outras providências necessárias serão tomadas tão logo a investigação estiver encerrada. O caso deixa a companhia certa de que precisa reforçar ainda mais os processos com a loja em questão e todas as demais”.
Ações conjuntas
Com a data finalmente estipulada, serão iniciadas negociações que podem resultar até na assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). As duas ações datadas de agosto e setembro de 2021 tramitam conjuntamente na mesma vara limeirense e as entidades pedem indenizações que ultrapassam R$ 260 milhões, além de obrigações como a de fazer com que seguranças privados não possam revistar e nem abordar consumidores da forma como foi feita.
Em uma das ações, consta a informação de outro caso semelhante na mesma época: em 6 de julho de 2021, um mês antes do ocorrido em Limeira, um jovem negro de 24 anos foi vítima em unidade do Assaí na cidade de Mauá, onde após sair do trabalho, foi até a loja e ao se deparar com o excesso de pessoas em seu interior, decidiu ir embora. No entanto, ao sair em direção ao estacionamento, foi abordado por dois seguranças, que diziam ter recebido denúncia de que ele portava arma de fogo.
“Portanto, não obstante o teor das notas que são publicadas após os casos de racismo, a ação do Réu no trato de seus clientes negros e negras continua a mesma, indicando a ineficácias das declarações de repúdio e das demissões dos seguranças e das declarações formais de respeito à diversidade, e indicando, por sua vez, a necessidade da tutela jurisdicional objeto do presente pedido”.